O decadente detetive particular Remo Bellini é contratado por um cliente desconhecido para encontrar O Livro da Lei. Desorientado e em estado de constante delírio devido ao vício em remédios de tarja preta, o investigador recebe um volumoso adiantamento pelo trabalho e inicia sua missão de encontrar o tal livro, aparentemente sem método algum. Bellini mergulha num submundo de crimes violentos, rituais satânicos e conspiração. Depois de consultar um demonólogo, fica sabendo que O Livro da Lei é um dos tomos escritos por Aleister Crowley, o maior bruxo da Nova Era e anunciador do Anticristo. Ao mesmo tempo que busca desesperadamente o livro, assassinatos violentos perturbam a rotina de policiais da cidade. Bellini é avisado pelo demonólogo que quando quatro pessoas forem sacrificadas na fase cheia da lua, a Besta subirá em sua nova forma - e os cadáveres vão se acumulando.
Bellini e o Demônio é o segundo filme adaptado dos livros policiais de Tony Bellotto, talvez mais conhecido como um dos integrantes da banda de rock Titãs. O anterior foi Bellini e a Esfinge, dirigido por Roberto Santucci em 2001. Nos dois, o detetive do título é interpretado por Fábio Assunção, fisicamente adequado ao papel, mas sua atuação não está acima do nível das telenovelas, com todos os cacoetes e exageros típicos de uma mídia que não tolera sutilezas.
A referência inicial que se tem diante da sinopse do filme é um cruzamento entre Coração Satânico, de Alan Parker, e O Último Portal, de Roman Polanski, e essa impressão paira durante todo o filme, indo e vindo. Porém, a bagunça é tamanha que em vários momentos fica duvidoso que caminho o filme pretende seguir. Alguma soluções narrativas são mais do que discutíveis, como colocar personagens dentro da própria cena que estão narrando num flashback. Tenta mostrar estilo, mas é apenas bobo, risível. A câmera treme, chacoalha e trepida em toda cena tensa - e o filme é todo tenso e dramático. Há um abuso de tomadas subjetivas, do tipo ‘alguém espreitando’, sem que nunca fique claro se é de fato o ponto de vista de algum personagem, um anseio de colocar o espectador numa posição desconfortável ou pura baderna. Num dos momentos mais absurdos, a câmera está dentro de um envelope de papel, olhando para a cara de Fábio Assunção, que olha para dentro do envelope! Por que? Impossível saber.
Fazia tempo que eu não via um filme (brasileiro) tão problemático. Certamente há algo de errado num filme que passou pelas mãos de quatro montadores e que tem três créditos distintos de roteiro (eu nunca tinha visto, num mesmo filme, créditos de ‘roteiro original’ e ‘roteiro adaptado’!). A trama tem buracos escandalosos; certamente passagens importantes foram eliminadas na montagem final, enquanto somos bombardeados por cenas repetitivas - Bellini às voltas com seus comprimidos e os policiais batendo cabeças durante as investigações. O diretor Marcelo Galvão andou dando entrevistas renegando o corte imposto pelo produtor. Enquanto que algumas fontes apontam que o filme tem 120 minutos de duração, a versão em DVD é substancialmente mais curta, com 85 minutos.
Porém, só podemos avaliar o filme lançado, não a versão ‘original’ que habita o limbo. Em comparação a Os Famosos e os Duendes da Morte e A Erva do Rato, dois filmes brasileiros recentes que possuem tênues - porém ricas e relevantes - relações com o horror, e são acusados de ‘pretensiosos’ devido às ambições artísticas, Bellini e o Demônio perde feio. Tenta ser artístico e estiloso onde não deveria; conta uma história relativamente simples, mas teima em complicá-la a troco de nada. Numa época em que Cisne Negro vira uma mania mundial, a proposta narrativa de Bellini e o Demônio poderia ser melhor aceita pelo grande público, mas as soluções são lastimáveis.
O próprio lançamento do filme é um drama à parte. Finalizado em 2008, foi exibido em maio do mesmo ano no festival de Los Angeles, nos Estados Unidos, de onde trouxe um prêmio de atuação para Fábio Assunção. Em setembro participou de um festival de cinema do Rio de Janeiro. Sua estréia comercial aconteceu quase dois anos depois, em agosto de 2010, passando praticamente despercebido. Co-produzido pelo TeleCine, nunca teve apoio decente do canal; nunca vi comercial na televisão ou qualquer coisa do tipo. Foi parar no DVD, também sem muita gente dar atenção, lançado alguns dias atrás. Desconfio, por mera desconfiança mesmo, que o fracasso nas bilheterias de Encarnação do Demônio, lançado em 8 de agosto de 2008, tenha influenciado na carreira abortada de Bellini e o Demônio, que chegou a ter sua data de lançamento marcada para 24 de outubro de 2008. Será que temeram que a temática ‘demoníaca’ pudesse afastar o público, numa época em que só se investe em filmes espíritas e com mensagens positivas?
É uma pena, pois tinha tudo para ser um pequeno grande filme de horror brasileiro. Enquanto não temos caminhos originais a percorrer, pelo menos poderíamos manter o gênero vivo com filmes mais convencionais, porém feitos com correção e sinceridade. Há cenas boas no filme, ou pelo menos com potencial latente, como a do demonólogo interpretado por Jack Militello. Porém, a superficialidade de conteúdo é denunciada pelo fato de levar tão a sério um sujeito como Aleister Crowley, o mais pop dos ocultistas, e a quem os que se dizem verdadeiros satanistas dão às costas e chamam de charlatão. Para encerrar, o anticlimático final surpresa - revelado no trailer, talvez pela ganância de achar que o nome de Marília Gabriela pudesse ser um chamariz de público - mostra em que pé estamos em termos de horror brasileiro.
Finalmente esse filme saiu! Uma pena que depois de toda essa enrolação, o resultado seja negativo. No mais, sua hipótese sobre a (má) influência do ENCARNAÇÃO e dos filmes espíritas faz todo o sentido.
ResponderExcluirNão sei se o motivo central seria o que foi dito no artigo que você escreveu e a Bia citou, Carlos. Pode ser, mas prefiro acreditar que é o descrédito e a ojeriza que o público brasileiro tem com produções brasileiras de um modo geral, porém com algumas exceções. Penso que apenas filmes como TROPA DE ELITE despertam algum interesse atualmente. E digo isso mediante algumas observações que tenho feito através de comentários de pessoas com quem convivo entre trabalho, faculdade, etc. É uma pena, mas eu gostaria que este filme, embora com seus pontos negativos, tivesse tido um resultado melhor.
ResponderExcluirCayman, desculpe-me, mas nem é questão de opinião, são números: nos últimos anos, filmes como SE EU FOSSE VOCÊ 1 e 2, A MULHER INVISÍVEL, BEZERRA DE MENEZES, CHICO XAVIER, NOSSO LAR, JEAN CHARLES, BRUNA SURFISTINHA e o já citado TROPA DE ELITE (1 e 2), entre muitos outros, renderam muita grana nas bilheterias, volumes assombrosos de dinheiro. E veja que são filmes de diferentes gêneros: comédia, drama, ação/policial, biografia etc. Eu ainda acho que existe um preconceito específico com horror brasileiro (até porque horror estrangeiro é extemamente popular no Brasil). O cinema brasileiro poucas vezes foi tão prestigiado pelo público, e basta ver os números ou a procura por DVDs nacionais em locadoras/camelôs/sites para constatar isso.
ResponderExcluirEu sempre desconfio desses filmes nacionais que ganham prêmios em obscuros festivais de cinema pelo mundo. Algo como premiado na mostra de cinema latino de Miami, laureado no festival do cinema brasileiro de Bucareste ou melhor ator no panorama da produção cinematográfica de Timbuktu, com patrocínio da Vale do Rio Doce.
ResponderExcluirLeandro, tem sempre que desconfiar mesmo, hehehe... Acho que o Brasil era campeão de trazer prêmios do Festival de Cinema da Holanda!
ResponderExcluirUm filme de horror brasileiro que precisa se apoiar em Aleister Crowley, é de despertar, no mínimo, desconfiança. Temos uma cultura e um folclore tão ricos, e os caras precisam pegar água no poço alheio. Sempre a mesma merda!
ResponderExcluirLee, nem acho que seja regra copiar o modelo estrangeiro, mas concordo que temos uma cultura vasta demais para não ser aproveitada. Não entendo, por exemplo, por que não fazem um filme sobre os poetas românticos do século XIX, que confraternizavam em cemitérios, violavam túmulos, improvisavam rituais satânicos... E ainda por cima eram jovens; ou seja, dá pra fazer isso tudo e ainda escalar o elenco da Malhação, hehehe... Enfim, com inteligência e vontade, dá pra começar a fazer filmes de horror bem brasileiros, e bons!
ResponderExcluir"a superficialidade de conteúdo é denunciada pelo fato de levar tão a sério um sujeito como Aleister Crowley, o mais pop dos ocultistas, e a quem os que se dizem verdadeiros satanistas dão às costas e chamam de charlatão."
ResponderExcluirFalou aí uma bobagem. A começar por associar Crowley à satanismo. Mas ok, esse erro todo mundo comete embora 5 minutos de pesquisa em qualquer Wikipedia da vida mostre que isso não tem nada a ver.
Segundo pq em se tratando de ocultismo, Crowley é referência básica (de forma velada ou declarada) em qualquer grupo de estudos. É a figura mais pop sim, mas certamente uma das mais relevantes também e enormemente responsável pelo modo como se entende e estuda ocultismo hoje em dia. Não conheço grande nenhum grupo/escola/ordem/etc que ao menos não cite algum trabalho dele, direta ou indiretamente.
Recomendo aos que quiserem saber mais sobre o assunto, pesquisar sobre Thelema e Aleister Crowley no Google. Depois de alguma peneirada no monte de bobagens que geralmente aparece, encontra-se informação bastante útil e livre deste preconceito bobo que ainda paira sobre ele.
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Talvez a 'bobagem' seja afirmar que fui eu que associei Crowley à satanismo. Isso está no filme: são satanistas que buscam o tal Livro da Lei, são pessoas que realizam cerimônias de culto ao Diabo e tudo isso; são eles que dão tremenda importância ao livro. O que fiz foi comparar os satanistas do filme aos da, digamos, 'vida real'. Chamei Crowley de 'ocultista', o que é confirmado até onde minha Wikipédia vai.
ResponderExcluirO segundo ponto que me interessa é apontar o aspecto pop dele: não vejo seriedade em alguém que, envolvido em algo supostamente importante como ocultismo, ser tão propenso a aparecer nas reportagens mais sensacionalistas e absurdas - que você confirma estudando os jornais da época ou lendo a biografia dele.
O Aleister Crowley é uma personalidade absoluta e inegavelmente fascinante, mas é esse lado pitoresco que faz gente como John Lennon, Jimmy Page, Raul Seixas ou Ozzy Osbourne o terem como referência em algum ponto - e por mais que eu aprecie o rock que esse pessoal faz (e eu amo Beatles e Led Zeppelin, por exemplo), eles seriam as últimas pessoas que eu teria como base na hora de me envolver com ocultismo, por exemplo.
Quanto ao 'preconceito bobo', fica por sua conta atribuir isso a mim. O que ocultistas estudam não está em discussão; o que apontei como 'pouco sério' foi o detalhe que - no filme - os satanistas terem como maior referência para seus intentos (vender a alma ao Diabo?) um livro escrito há apenas 70 anos. E pior - que eles poderiam comprar diretamente na Amazon por $9.95: http://www.amazon.com/Book-Law-Aleister-Crowley/dp/0877283346.
Corrigindo uma bobagem que escrevi: o livro não tem 70 anos (eu havia lido uma bibliografia do Crowley atribuindo o ano de 1938 a esse livro): ele foi escrito em 1909, então tem praticamente 100 anos. Aliás, os produtores do filme poderiam ter aproveitado o gancho comercial disso, e comemorar o centenário do livro mais famoso do bruxo da Nova Era!
ResponderExcluirO jack Militello ta veio hein! Eh muita cocaina! kkkkkk
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