O gênero policial é um dos poucos nichos do cinema brasileiro relativamente prolífico, principalmente em comparação com o horror. Desde os tempos dos grandes estúdios, os experimentalismos do cinema marginal e o sensacionalismo das realizações da Boca do Lixo, chegando aos arrasa-quarteirão dos anos mais recentes, o gênero policial é muito bem representado no cinema nacional. A Próxima Vítima, de João Batista de Andrade, é um dos melhores exemplares de suspense policial da década de 80, em alguns momentos se assemelhando aos bons filmes americanos do gênero, com ritmo correto e personagens bem desenvolvidos. Não se trata de um filme de horror, mas merece menção na filmografia brasileira do gênero por tratar de um caso verídico de um assassino em série, que ficou conhecido como “o Vampiro do Brás”. A contribuição do cinema brasileiro neste subgênero é modesta - cerca de meia dúzia de títulos, se tanto - e por isso mesmo acredito que merece ser tratada com atenção.
Antônio Fagundes, num dos melhores momentos de sua carreira, faz o papel de um repórter de telejornal encarregado por seu patrão (Goulart de Andrade, aquele do “vem comigo!”) de fazer a cobertura de uma série de homicídios de prostitutas no bairro paulistano do Brás, tradicional reduto da colônia italiana. Imerso num cenário de absoluta decadência e corrupção, o repórter acaba se envolvendo com uma prostituta menor de idade (a debutante Mayara Magri), a qual ele teme que se torne a próxima vítima do maníaco sexual. Enquanto isso, outras mortes continuam a ocorrer.
A trama tem como pano de fundo as eleições diretas de 1982, com imagens documentais mostrando Jânio, Montoro e Lula concorrendo ao governo do estado de São Paulo. A crítica social, o pessimismo e a desesperança no futuro são onipresentes na trama; a corrupção das autoridades e a incompetência da polícia são elementos determinantes para levar a história a um desfecho trágico. Ao mesmo tempo corajoso e anti-utópico, o roteiro de Lauro César Muniz ousa desdenhar da esperança em uma nação democrática prometida pelas primeiras eleições diretas realizadas no Brasil depois do período de Ditadura Militar. O personagem de Fagundes, à certa altura, faz um discurso anárquico e revoltado em relação ao futuro político brasileiro.
O filme não se interessa em explorar os crimes sexuais, mostrando muito rapidamente cada vítima, mas um clima tenso constante domina a narrativa. O horror, neste caso, emerge tanto do cenário decadente da prostituição e do crime quanto da podridão que domina a política e a polícia.
Primeiramente, quero parabenizar-lhe pela brilhante iniciativa de criar este blog, pois sequer concebo a ideia de que talentos, como o seu e o da Bia, fiquem adstritos somente a um pequeno grupo de admiradores. Vocês tem um conhecimento muito vasto, muito amplo, sobre cinema, e dominam, como poucos, nosso idioma. Tais ingredientes tornam a leitura dos textos que escrevem uma atividade prazeirosa, ao ponto de lamentarmos quando chegamos ao fim.
ResponderExcluirGostei muito da sua pretensão de alimentar o blog com matéria referente a filmes vistos a cada dia, pois, desse modo, descarta a necessidade de revirar arquivos em busca de subsídios, quase sempre não encontrados, pelo imenso volume de coisas que colecionamos, enquanto pesquisadores. Sabe-se que estas buscas, além da possibilidade de resultarem estéreis, tem também o condão de inviabilizar qualquer projeto, pelo desestímulo. Portanto, parabéns, também por isto!
Quanto ao filme de hoje, A Próxima Vítima, gostaria de saber se tem algo em comum com uma novela apresentada pela TV Globo, em passado recente, que tinha o mesmo título. Andei vendo uns capítulos e, salvo engano, havia referências ao nome de Lauro César Muniz.
Opa, primeiro de tudo, é uma baita honra ter visitas desse nível no meu blog! Espero que sejam frequentes. Como falei para a Bia, escrever é, acima de tudo, prática. Quanto mais se escreve, mais fácil fica, ainda que escrever seja difícil (pelo menos para mim é!).
ResponderExcluirTambém conheço essa novela "A Próxima Vítima", mas pelo que li, era do Silvio de Abreu. Acho que era mais uma trama de mistério mesmo, com um assassino que matava as pessoas seguindo o horóscopo chinês ou algo assim. Parece que o cenário era parecido com o do filme, no bairro italiano de São Paulo.
Sobre as escolhas dos filmes, de fato, fica mais simples para mim pegar o que vi no dia. Também acho mais honesto com o formato de blog, que geralmente é algo próximo de um diário. Obrigado pela visita e escreva sempre!
Que "Do Inferno" soou esse filme! Adorei o texto! Sobre a comparação com a novela, acho que não tem nada a ver, não, pois pelo que me lembro, o assassino era o mordomo de uma família rica (que original!). Acho que era apenas mais uma trama de mistério.
ResponderExcluirA Bia tem razão, nessa novela, o matador era realmente o mordomo, seguindo, portanto, o velho padrão para este tipo de trama. Agora, só não me ocorre é se suas vítimas também eram prostitutas, a exemplo do que acontece no filme, que, segundo aprendi aqui neste espaço, baseia-se em fatos reais passados no bairro paulista do Brás, reduto da colônia italiana aqui no Brasil.
ResponderExcluirAh, pelo que vejo, gostando - como gosto - de ler o que vocês escrevem, de repente vou acabar é me tornando cinéfila. Vocês não acham?
Seria um verdadeiro motivo de orgulho para mim que meus textos a induzissem a tornar-se cinéfila! Só acho que eu não recomendaria determinados filmes de horror que certamente passarão por aqui a alguém que não esteja acostumado ao gênero! Ainda sobre a novela, acho que não teria como se matarem prostitutas, pois a trama se tornaria óbvia logo e todo mundo saberia quem morreria pelos próximos meses de novela!
ResponderExcluirUma pergunta: Como vc consegue arrumar estes filmes para assistir, sao velhos Vhs ou o que? fiquei interessado em assistir mas nao encontro...
ResponderExcluirOlá, Anônimo. Depende do filme. No caso específico dos brasileiros, foram anos de pesquisa, comprando e trocando com colecionadores, fazendo prospecção em sebos e locadoras, gravando de TV... Pouquíssima coisa existe em DVD. Foi uma pesquisa séria e profissional, não juntei os filmes por hobby apenas; pelo trabalho que isso dá, não vale a pena fazer por mera diversão! Sobre o filme do tópico, eu tenho o VHS original de "A Próxima Vítima", comprado num sebo.
ResponderExcluirPutz! Este é um filmaço!!! Vi a uns dois anos em algum canal educativo da TV a cabo e virei fã! Simplesmente perfeito!
ResponderExcluirE o texto, competente como sempre.
tem como disponibilizar uma copia do filme A PROXIMA VITIMA pra mim????
ResponderExcluirou tem como explicar como se grava um filme da TV