Quem tem o hábito de ler artigos mais antigos sobre o cinema de horror certamente já se deparou com o termo grand guignol, que era usado com certa frequência pelos críticos de outrora para descrever o conteúdo mais violento e sanguinolento de determinados filmes. Ainda hoje há quem use o termo e eu mesmo costumo recorrer a esse charmoso estrangeirismo para especificar o tipo de violência gráfica e gratuíta que marca algumas produções mais sensacionalistas das décadas de 50, 60 e 70. Realizações britânicas desse período, como Sangue de Vampiro (1958), Névoas do Terror (1965) e as produções da Hammer são alguns exemplos clássicos de grand guignol nas telas, e é também a maneira ideal de descrever o estilo de horror praticado por Pete Walker, diretor que iremos dissecar nas próximas postagens.
A origem do termo é o Théâtre du Grand-Guignol, localizado em Paris, que se tornou infame por apresentar peças grotescas de horror com cenas explícitas de decapitação, desmembramento, esquartejamento, evisceração e outras práticas de imolação corporal. O teatro - o menor de Paris, com menos de 300 assentos - iniciou as atividades em 1897, onde antes funcionava uma pequena igreja. A velha arquitetura católica lhe propiciava um aspecto ainda mais tétrico, com os antigos confessionários transformados em camarotes. André de Lorde foi o principal dramaturgo do Grand-Guignol, escrevendo pelo menos uma centena de peças curtas entre 1901 e 1926, especializando-se em narrativas sobre loucura e demência, contando com a colaboração do psicólogo experimental Alfred Binet.
O Grand-Guignol oferecia uma grande variedade de peças no estilo brutal do teatro naturalista, quase sempre tratando de personagens das camadas mais baixas da sociedade francesa, como criminosos e prostitutas. Cada sessão era composta por cinco ou seis peças curtas, nem todas de horror, mas foram as apresentações neste gênero mais extremo que consolidaram a fama do teatro. Os efeitos especiais chocantes e os finais invariavelmente sanguinolentos ao mesmo tempo fascinavam e criavam repúdio na platéia, garantindo a fama do Grand-Guignol mundo afora. O estilo de horror explícito do teatro francês naturalmente foi absorvido pelo cinema, desde Dr. Gogol, o Médico Louco (1935) e Olho Diabólico (1960) até os exageros de artistas tão díspares quanto Herschell Gordon Lewis e Dario Argento.
A decadência do Grand-Guignol teve início depois do final da Segunda Guerra Mundial e o teatro fechou definitivamente suas portas em 1962. Charles Nonon, o último diretor do teatro, resumiu assim seu declínio: “Antes da guerra, todos tinham a sensação de que o que acontecia em cima do palco era algo impossível. Agora sabemos que essas coisas, e outras ainda piores, são uma realidade possível”. O site GrandGuignol.com oferece um interessante apanhado sobre a história do teatro parisiense e seu legado perene para o entretenimento de horror.
A primeira vez que eu li o termo foi exatamente numa edição da saudosa Cine Monstro. E fiquei sem saber o que era. Valeu pelo esclarecimento! :)
ResponderExcluirA derradeira exibição do Grand Guignol foi registrada num desses filmes "mondo" dos anos 60/70. Não me lembro qual, mas já saiu em DVD nos EUA.
ResponderExcluirCarlos belíssimos os cartazes do Grand-Guignol. Também vi o termo pela primeira vez numa certa revista especializada em horror... Marcone.
ResponderExcluirAS SETE MÁSCARAS DA MORTE [Theatre of Blood]. Um dos filmes que mais me fascinou nos anos 70 e um dos cinco melhores de Vincent Price. Foi através da temática desse filme que comecei a entender realmente o termo Grand Guignol em algumas críticas de cinema da época. E a presente postagem do Cine Monstro mostra o quanto este blog é vasto na cultura cinematográfica a que se propõe.
ResponderExcluirWow, ótimo texto! Pesquisando um pouco mais pela internet, vi que até o Dylan Dog tem uma história envolvendo este tema! Essa eu não li...
ResponderExcluirDá até um pouquinho de vergonha de dizer isso, já vi o termo algumas vezes e fui peguiçosa para pesquisar, e deixei "passar batido". OOps! Eis que de mão mordida caiu aqui uma perfeita explicação! E tenho certeza que mesmo que eu tivesse procurado antes não teria tanto prazer em entender como desta maneira. Muito bom!
ResponderExcluirSegue a cena citada pelo colega Leandro do "shock-umentary" ECCO de 1963.
ResponderExcluirhttp://www.youtube.com/watch?v=3dN06iALMTk
Acho que fiquei sabendo sobre o Grang Guignol justamente em DR. GOGOL, O MÉDICO LOUCO, mas só sabia o básico, que era um teatro francês com peças grotescas. O seu texto foi muito esclarescedor! :)
ResponderExcluirótimo texto! parabéns! muito esclarecedor para quem gosta de cinema e cultura.
ResponderExcluirMuito bem lembrado.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluir